BANGLADESH E A DINÂMICA DA POLARIZAÇÃO POLÍTICA GLOBAL
- Mariele Santos
- 21 de ago. de 2024
- 3 min de leitura
Atualizado: 6 de fev.
O poder não dura para sempre
A polarização política está frequentemente ligada, de alguma forma, a intervenções militares, como vimos em diversos lugares ao redor do mundo. Essa realidade se torna mais visível agora, com o maior acesso à informação. A crise em Bangladesh, na Ásia, é mais um exemplo de um jogo político que acaba por emergir. O velho resiste em morrer, e o novo não consegue nascer — sinto que estamos no quase, presos em uma transição difícil, onde o futuro parece estar ao nosso alcance, mas ainda escapa pelas mãos.

Os protestos em massa em Bangladesh começaram como uma oposição às cotas de emprego no serviço público, especificamente uma proposta para reservar 30% das vagas para parentes de ex-combatentes da guerra de 1971, quando Bangladesh se emancipou do Paquistão. Os manifestantes argumentam que essa política é injusta e discriminatória, especialmente diante dos altos índices de desemprego juvenil, que giram em torno de 40% — cerca de 32 milhões de jovens sem rendas. Eles alegam que as cotas beneficiariam principalmente membros do partido da primeira-ministra.


Esses protestos evoluíram para um movimento amplo que levou à queda do governo autocrático de Sheikh Hasina, da Liga Awami (LA). Após 15 anos no poder, Hasina foi forçada a renunciar em 5 de agosto de 2024, depois de uma violenta repressão estatal que resultou em centenas de mortos e desaparecidos. O movimento popular, semelhante a revoltas em países como Sri Lanka e Filipinas, conseguiu derrubar o governo, apesar da brutal repressão.

A saída de Hasina marcou o fim de um ciclo político da Liga Awami, que havia consolidado seu poder desde a vitória eleitoral de 2008. O governo, que inicialmente se apresentava como secular e progressista, tornou-se cada vez mais autocrático, reprimindo tanto a oposição do Partido Nacionalista de Bangladesh (BNP) quanto movimentos populares de esquerda. A oposição foi severamente perseguida, com líderes presos e atividades políticas bloqueadas, enquanto a LA se aproximava de grupos islâmicos radicais para manter seu controle.

Agora, há ceticismo sobre a capacidade do governo interino, liderado por Muhammad Yunus, de enfrentar os profundos problemas sociais do país. Yunus, conhecido como o “guru do microcrédito” e ganhador do Prêmio Nobel da Paz, enfrenta grandes expectativas. Como fundador do movimento de microcrédito e promotor de “negócios sociais”, ele era visto como uma figura importante no mundo das ONGs neoliberais.

No entanto, a vingança política implacável do governo de Hasina contra ele na última década e sua decisão de apoiar o movimento estudantil o transformaram em uma figura inesperada para liderar o país. Apesar de ser visto pelos estudantes como um líder proeminente, sua política neoliberal de austeridade pode estar em desacordo com a principal demanda deles, que é o emprego.
Yunus, com um histórico de políticas neoliberais, enfrenta agora a difícil tarefa de restaurar a ordem e conduzir o país a eleições democráticas, enquanto lida com um cenário político fragmentado e marcado pela desconfiança em relação às instituições tradicionais. Sua liderança é vista como uma tentativa de trazer estabilidade temporária, mas há dúvidas sobre sua capacidade de abordar questões estruturais profundas, especialmente relacionadas à pobreza e desigualdade.
O governo interino de Yunus é composto por uma equipe diversificada, mas a falta de representantes da classe trabalhadora e o foco em burocratas e militares aposentados levantam preocupações sobre a representatividade e a capacidade real de transformação social do governo.

O futuro de Bangladesh dependerá de como Yunus e sua equipe responderão às demandas populares por justiça social e econômica, e de como o movimento estudantil e outros grupos sociais continuarão a pressionar por mudanças estruturais. É um momento de incerteza, onde mudanças profundas estão por vir, mas o caminho até elas ainda é longo.




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